sábado, outubro 20, 2007

Teogonia 116-122

Sim bem primeiro nasceu Caos, depois também
Terra de amplo seio, de todos sede irresvalável sempre,
dos imortais que têm a cabeça no Olimpo nevado,
e Tártaro nevoento no fundo do chão de amplas vias,
e Eros: o mais belo entre Deuses imortais,
solta-membros, dos Deuses todos e dos homens todos
ele doma no peito o espírito e a prudente vontade.

[Tradução de Jaa Torrano]

quinta-feira, outubro 18, 2007

Anacreonte # 2

1.
Traz essa taça, ó rapazinho,
Para que agora um trago eu prove,
E cinco doses põe de vinho,
Uma de água com mais nove.
Eu decidi, sem insolência,
Honrar a Baco em compromisso,
Dispenso agora a exigência,
O formalismo, e mais serviço!
Não quero claque ou audiência. [Fr.4 Diehl]

2.
Detesto quem evoca
Prantos da fera guerra,
Enquanto os lábios molha
Ao vinho da cratera.
Por isso eu amo quem
Mistura Musa e Vênus,
E os dons da farra tem,
Esplêndidos, serenos.

3.
Alva me restou a fronte,
Me são têmporas grisalhas,
Vão meus verdes anos: onde?
Já meus dentes são limalha!
Resta-me viver da vida
Um sopro que vai morrendo,
Por que choro sem guarida?
Pelo Tártaro, que é horrendo.
Mas terrível é que a ida
Não tem volta, é só descendo.

Alceu - Fr.357 LP

Reluz em bronze a sala. De elmos brilhantes todo o teto está
apinhado, onde se ondeiam crinas alvas de cavalo, que hão de
ornar a testa dos guerreiros. E dos ganchos penduradas, mil luzidas
caneleiras são o aval contra uma lança poderosa. De linho
novo revestidas,as couraças juncam-se no chão, em meio a
côncavos escudos. Espadas da Calcídia pelos lados, montes de
túnicas e cinturões. Que não se esqueça coisa alguma, que a
peleja se aproxima.

[Tradução: Antônio Medina Rodrigues]

Íbico

Alçam-se os marmeleiros na primavera,
E os romanzeiros na vazão dos rios,
Onde o jardim das virgens sensualizam rosas.
Dulçura exorbita em gomos, sob os pâmpanos.
Contudo, a mim, jamais o amor me adoça ou passa.
Tortura-me deus Eros, como o Bóreas trácio,
Quando seus trovões da Cípria assopra
Roucos, indefensáveis, tenebrosos,
e sob as pálpebras de névoa,
Eros, por cima, cálido me espia,
Para lançar-me aos laços de Afrodite,
Aos mansos passos de Eros estremeço
Qual cavalo velho, fatigado das vitórias,
E que em carro alucinado, contrafeito,
Lança em últimas contendas a carcaça. [Fr.6D]

[Tradução: Antônio Medina Rodrigues]

Priapo

1.
Por que em mim não tem veste a parte obscena, indagas?
Indaga se algum deus seus dardos cobre:
às claras o senhor do céu detém seu raio,
não se oculta o tridente ao deus das águas;
nem Marte esconde aquela espada com que é bravo
nem Palas guarda a lança em dobras tépidas.
Portando setas de ouro Febo acaso cora?
Diana sói levar, esconsa, a aljava?
E Hércules cobre a massa da nodosa clava?
O deus alado vela o caduceu?
Quem viu Baco estender no grácil tirso as vestes?
E quem, Amor, te viu de rosto oculto?
Não seja crime que meu pau se mostre sempre:
que se esta lança falta, eu sou inerme. [Priapea latina,9]

2.
Quem sejas tu que no meu alvo muro vês
poemas nada castos mas jocosos,
não te ofendas com versos obscenos, meu pau
não há de te fazer franzir o cenho.[Priapea latina, 49]

3.
Matronas castas, ide p'ra bem longe:
palavras sem pudor vergonha é lerdes!
(Não dão a mínima e aqui vêm direto;
Não admira, também matronas vêem,
degustam com prazer um pau enorme.)[Priapea latina,7]

4.
Se menino, enrabar; se menina, foder;
Ladrões barbados têm terceira pena.[Priapea latina,13]

5.
Caia eu morto, Priapo, se não sinto
vergonha de empregar palavras vis,
obscenas, mas se tu, que és deus sem ter
pudor, me mostra teus colhões de fora,
"boceta" e "pau" preciso pronunciar.[Priapea latina,29]

6.
Temos no corpo formas conhecidas.
Febo, os cabelos. Hércules, seus músculos;
o jovem Baco, o aspecto de menina;
Minerva é loira; oblíquo olhar tem Vênus;
Faunos da Arcádia, os chifres na cabeça;
belos pés tem o porta-voz dos deuses;
dá passos desiguais quem guarda Lemnos;
Esculápio tem sempre a barba longa;
ninguém tem peito como o bravo Marte.
E se entre todos me sobrar espaço,
que deus tem pau maior que o de Priapo?[Priapea latina,36]

7.
Pela beleza agrada ver Mercúrio,
pela beleza Apolo é admirável,
belo também Lieu é figurado.
mais belo que todos é Cupido.
Quanto a mim, sei, não tenho belas formas,
porém meu pau é esplêndido e qualquer
menina vai querê-lo mais àqueles
deuses, se não for tola de boceta. [Priapea latina,36]

8.
Tu, p'ra não veres meu viril sinal,
desvia-te como convém às castas.
É claro! A menos que o que temes ver
desejas que te adentre até as vísceras.[Priapea latina,66]

9.
Se, rústico, pareço ter inculta fala,
perdão!, não junto livros, junto frutos.
Mas rude embora, à força eu ouço meu senhor
a ler, e uns termos aprendi de Homero:
p'ra nós o que é "caralho" chama de karákallon,
e o que chamamos "cu" chama de cúleon.
Se merdaléon é aquilo que não tem limpeza,
é "merdaleu" o pinto dos que enrabam.
Mais!: Se a boceta Argiva não quisesse um pau
Troiano, não teria o que a cantasse.
Não fosse tão famoso o pinto do Tantálida,
de nada se queixara o velho Crises.
O mesmo pau tirou do amigo a doce amante:
sendo de Aquiles, quis que fora sua,
e um triste canto o herói cantou à Peletrônia
cítara, estando teso mais do que a cítara.
Na ira então começa a Ilíada famosa
foi o princípio do sagrado canto.
Matéria do outro é a errância do falaz Ulisses
e, a bem dizer, tesão foi que o moveu:
lemos de uma raiz que gera flor dourada
que, embora moly a chamem, era um pau;
lemos que Circe, que a Atlantíade Calipso
do herói Dulíquio o grande dote ansiaram.
Depois, ao ver que mal cobriu seu membro um espesso
ramo, a filha de Alcínoo se espantou.
Mas corre o herói à velha esposa só pensando,
Penélope, na tua bocetinha,
e casta, só ficaste por querer banquetes
e ter de fodedores cheia a casa,
e por saberes no arco o mais valente, assim
falaste aos pretendentes excitados:
"Ninguém, qual meu Ulisses, retesou sua arma,
de força usando ou de perícia. Agora
é morto, e vós! a arma entesai: que verei
quem é que é homem p'ra ser meu homem".
E eu poderia então te dar prazer, Penélope,
mas eu ainda não tinha sido feito.[Priapea latina,68]

[Tradução: João Angelo Oliva Neto]

quarta-feira, outubro 17, 2007

Horácio I.14

O nauis, referent in mare te noui
fluctus. O quid agis? Fortiter occupa
portum. Nonne uides ut
nudum remigio latus,

et malus celeri saucius Africo
antemnaque gemant ac sine funibus
uix durare carinae
possint imperiosius

aequor? Non tibi sunt integra lintea,
non di, quos iterum pressa uoces malo.
Quamuis Pontica pinus,
siluae filia nobilis,

iactes et genus et nomen inutile:
nil pictis timidus nauita puppibus
fidit. Tu, nisi uentis
debes ludibrium, caue.

Nuper sollicitum quae mihi taedium,
nunc desiderium curaque non leuis,
interfusa nitentis
uites aequora Cycladas.


Ó nau, ao mar te tornam novas ondas!
O que fazes? Com força o porto aferra.
Por ventura não vês, que as amuradas
Estão de remos nuas?

Que pelo ligeiro Àbrego ferido
O mastro geme, gemem as antenas?
E sem amarras mal as quilhas podem
sofrer soberbos mares?

Não tens velas inteiras, não tens deuses,
Que em novo perigo sossobrada invoques,
Inda que tu, ó Pôntico pinheiro,
De nobre selva filho,

Inútil geração e nome ostentes:
Tímido nauta nas pintadas popas
não se afiança. Aguarda, se não queres
ser ludíbrio dos ventos.

Tu, que tédio solícito me deste
Há pouco, ora saudade e grão cuidado,
Dos mares foge aparcelados entre
As Cicladas luzentes.

[Tradução: Elpino Duriense]

sexta-feira, outubro 12, 2007

Horácio, 1.9

Garçom, faça o favor,

nada de luxos persas.

Nem me venha com estes

enfeites de tília.

Rosas? Não quero rosas,

Se alguma ainda esquiva

Resta da primavera.

Para mim basta o mirto.

O simples mirto.

O mirto com você

também combina,

Puer, garçom-menino,

ministro do meu vinho,

Que o vai servindo,

enquanto eu vou bebendo

Sob a cerrada vinha.

[Tradução: Haroldo de Campos]

Catulo, 32 - outra tradução

Vamos, minha doce Ipsistila, minha
delícia, meu
pão:
convida-me a passar a tarde contigo.
Se me dás essa chance
tira o trinco da porta e
cancela o restante:
espera-me disposta
para o jogo da dama:

nove vezes, na cama.


A idéia te inflama?
Então, basta de dúvida!
Almoçado a regalo, reclinado em decúbito,
aqui estou,
como falo:

-perfuro túnica e pálio!


Outras traduções: José Paulo Paes, Nelson Ascher, João Angelo Oliva Neto.

Catulo 14b

Se acaso lês estes meus desmandos
e se não te repugna
aproximar de mim tuas mãos

[Tradução: Haroldo de Campos]

Catulo, 39

Egnatius
porque tem dentes brancos
ri à toa.
Se alguém está no banco dos réus
e o advogado arranca lágrimas do júri
Egnatius ri.
Ri.
Em qualquer momento ou lugar.
É seu fraco. Ofensivo
à elegância e à urbanidade.
(creio).
Aprende pois
Egnatius
meu velho:
ainda que fosses da Capital
ou da Sabina
ou de Tibur
um úmbrio sovina ou um etrusco obeso
um lanuvino moreno e de bons dentes
ou
(para incluir meus conterrâneos) um
transpadano ou
de qualquer parte onde se faça um mínimo
de higiene bucal
ainda assim
eu não suportaria os teus dentes ridentes.
nada mais alvar que um riso alvar.
Mas acontece que és celtíbero.

Na Celtibéria
costumam de manhã com a própria urina
enxaguar caninos e gengivas.

Dentes mais brancos?
Maior ração de urina.

[Tradução: Haroldo de Campos]

Catulo, 41 - Outra tradução

Ameana, piranha desfrutável,
me pediu dez mil sestércios
ao todo!
Aquela mesma,
a menina de nariz torto,
comida do banquirroto Formiano.

Parentes e vizinhos dessa moça
chamem o médico,
reúnam (ela não anda boa)
o conselho da família.
Que tem?
Excesso...
de fantasia.

[Tradução: Haroldo de Campos]

Outra tradução: João Ângelo Oliva Neto

Catulo, 13

Vais jantar bem, Fábulo, em minha casa
qualquer noite destas.
Basta que tragas o favor dos deuses
e ainda
o "couvert", o assado, o vinho, muito sal,
uma companheira enxuta
e uma reserva de risadas.
Nessa base, vais jantar bem:
a bolsa do teu Catulo está cheia
de teias de aranha.
Em troca, mera amizade
e o que me resta de raro e refinado:
um perfumne
-Vênus e os amores! -
o aroma - o cheiro da minha dona.
Fábulo,
uma fábula!
Vais virar nariz.

[Tradução: Haroldo de Campos]

Catulo, 82

Quíncio,
queres que Catulo te deva os olhos
e o que há de mais caro que os olhos?
Não lhe roubes o que é
muito mais caro do que os olhos
ou do que há de mais caro que os olhos.

[Tradução de Haroldo de Campos]

Catulo, 3 - Outra tradução

Chorai, coro de Graças e Cupidos,
e todos aqueles que veneram Vênus.
Morreu o pardal de Lésbia.
o doce pássaro de minha namorada,
prenda que ela amava mais que os olhos.
Ave de açúcar, seguia sua dona
como a pupila à mestra.
Sempre mimado em seu regaço
- aqui, ali, saltarinando -
só pra ela ensaiava o gorgeio.
Agora se foi para a terra das trevas
de onde ninguém retorna.
Malditas, malignas sombras do Orco
devoradoras de tudo quanto é belo:
privaram-me de um pássaro belíssimo!
Pobre passarinho de pêsames:
por tua causa, os olhos de minha amada
turvam-se, vermelhos de pranto.

[Tradução de Haroldo de Campos]

Outra tradução: João Ângelo Oliva Neto.

Catulo, 27

Menino do vinho
tu que serves o velho Falerno
enche meu copo do mais amargo:
é a lei de Postúmia,
professora de orgia, uva
mais bêbada que as uvas bêbadas.
Água, ninfa insípida,
sai daqui
- fora! -
linfa
corruptora do vinho. Te manda
para a banda dos austeros.
Aqui
só o puro Tioniano.

[Tradução: Haroldo de Campos]

Menino que vertes velhos Falernos,
me serve, ministro, taças amargas,
que a lei de Postúmia, a mestra, requer,
mais bêbada que uva em mosto embebida.
Fora daqui, águas, ide bem longe
–Ruína do vinho – junto aos severos
Migrai, que este é puro néctar de Baco.

[Tradução: João Ângelo Oliva Neto]

Catulo, 6

Flávio,
se a dona que te delicia
tivesse um pingo de classe
dirias seu nome a Catulo:
não te aguentarias calado.
Estás caído por uma
cadela cadavérica.
De vexame,
calas.
Não passa noites de viúvo:
teu divã é a fala do mudo.
Pétalas, perfumes,
almofadas amassadas,
e esta cama aos abalos, que range e resvala!
Peito magro é leito de farras.
Anda, o nome dessa dona!
Boa
ou má (sim ou não) vou
te lançar as nuvens
no vôo destes versos.

(Tradução: Haroldo de Campos)

Catulo, 91

Um mago há de nascer do conúbio nefando
de Gelus e sua mãe
e que ele aprenda dos persas a arte dos arúspices.
Se a ímpia religião da Pérsia é verdadeira
mãe e filho gerarão(por força) um mago
grato aos deuses
e que há de louvá-los com palavras propícias
liqüefazendo nas chamas entranhas pingues de vítimas.

[Tradução: Haroldo de Campos]

Catulo, 52

Morre sem demora, Catulo!
Nonius, o furúnculo,
senta-se na curul.
Vatinius, agora,
é o cônsul do perjúrio.
Que demora, Catulo!
Morre.

[Tradução de Haroldo de Campos]

Catulo, 38

Cornificius, teu Catulo anda mal,
mal, por Hércules, penas
e mais penas,
cada vez mais, dias a fio,
penas a fio...
E tu nenhuma palavra de fácil
ínfimo
mínimo
consolo!
Me irritas!
Não te importam minhas mágoas?
Manda-me uma nesga de conforto:
um verso
mais escuro que os lamentos de Simônides.

[Tradução Haroldo de Campos]

Catulo, 58

Célio, nossa Lésbia,
Lésbia,
a Lésbia que Catulo amou
mais do que a si mesmo e do que aos seus
agora
em becos e bibocas
suga os membros
(gulosa)
da estirpe magnânima de Remo.

[Tradução de Haroldo de Campos]

Catulo, 86

Quintia formosa est multis. mihi candida, longa,
recta est: haec ego sic singula confiteor.
totum illud formosa nego: nam nulla uenustas,
nulla in tam magno est corpore mica salis.
Lesbia formosa est, quae cum pulcerrima tota est,
tum omnibus una omnis surripuit Veneres.



Quíntia para muitos é bela. Para mim
é longa lisa esbelta.
Até aí eu vou.
No conjunto,
nego que seja "bela": nenhuma finura,
nenhum grão de sal nesse seu grande corpo.

Lésbia é bela. De beleza total.
E dessa graça especial - dom de Vênus -
que subtrai às outras todas juntas.

[Tradução de Haroldo de Campos]

Catulo, 7

Quantos dos teus beijos, Lésbia
serão precisos para que eu diga "basta!"?
Tantas as areias numerosas
da Líbia, onde está Cirene, rica em ungüentos,
entre o oráculo de Júpiter ardente
e o túmulo sagrado do velho Batus,
tanto os astros velando os amores furtivos
dos homens, mal a noite cala,
quantos os beijos que deve dar ao desvairado
Catulo, para fartá-lo de beijos,
sem que os curiosos tenham jeito de contá-los
e as más línguas de vibrar seus agouros.

[Tradução de Haroldo de Campos]

Catulo, 1

A quem dedico este livrinho, novo em
folha,
recém-polido por uma áspera
pedra-pomes?
A ti, Cornelius.
Davas algum valor às minhas nugas
desde quando, único no Lácio,
versavas o Universo
em Três Tomos.
Que saber - Júpiter! -
Que labor!
Aceita, pois,
sem mais,
este meu nada: um
livrinho.
Que ele passe - ó Musa
patrona uirgo
protetora -
o marco do século:
perene.

Alceu - A décima musa

ó

coroada de violetas

sorriso-mel

sagrada

Safo

(tradução: Haroldo de Campos)

Alceu - Fr.96 Diehl

bebamos!
não fazem falta lâmpadas!
basta um dedo de dia para as grandes
copas multiadornadas vamos
ergue-as! o
filho de sêmele e zeus
diôniso
nos deu aos homens vinho
lassidão contra a dor - olvido:
a cada parte de água duas
só de vinho assim
plenas até a borda
bebamos -
uma após a outra - copas
e mais copas!

[Tradução de Haroldo de Campos]


Bebamos! Porque aguardamos as lucernas? Já só há
Um palmo de dia. Retira, célere, dos pregos, as grandes taças.
O vinho que dissipa aflições, doou-o aos homens o filho
de Zeus e Sémele. Deita-o nas taças, uma parte para duas,
cheias até à borda, e que um cálice
empurre o outro.
[Tradução de Maria Helena da Rocha Pereira]

Outra tradução: Antônio Medina Rodrigues

Mimnermo 1: tìs dè bíos...

que vida sem o consolo
de afrodite - ouro e crisólitos!
melhor morrer quando não mais
o mel do prazer a cripta
do amor furtivo a cama
me disserem: ama!

(Tradução de Haroldo de Campos)


Outra tradução: Antônio Medina Rodrigues

Safo: gênese do poema

vem

lira quelônia

divina:

vira

sompoema

(Tradução: Haroldo de Campos)

Safo 5

Morto o doce adônis
e agora citeréia
que nos resta?
lacerai os seios donzelas
dilacerai as túnicas

(Tradução Haroldo de Campos)

Àlcman de Sárdis

cantam
um por um os distingo
pássaros

temas & timbres:
alcman inventa
em mimolíngua
o canto das perdizes

(Tradução de Haroldo de Campos)


Estes versos [épe] e esta música[mélos], Álcman
a inventou tendo entendido
das perdizes as falas canoras. (Fr.96D)

(Tradução de Maria Helena da Rocha Pereira)

domingo, outubro 07, 2007

Persas - vv.401-405

(...) "Ó filhos de gregos, ide,
libertai vossa pátria, libertai os vossos
filhos, mulheres, templos e deuses pátrios
e túmulos dos pais, por todos é o combate."

[Tradução de Jaa Torrano]

Cartas a Lucílio I - 2

Tanto aquilo que me escreves como o que oiço dizer de ti fazem-me ter boas esperanças a teu respeito: não viajas continuamente nem te deixas agitar por constantes deslocações. Um semelhante deambular é indício duma alma doente: eu, de fato, entendo que o primeiro sinal de um espírito bem formado consiste em ser capaz de parar e de coabitar consigo mesmo.

Toma, porém, atenção, não vá essa tua leitura de inúmeros autores e de volumes de toda a espécie arrastar algo de indecisão e de instabilidade. Importa que te fixes em determinados pensadores,que te nutras das suas idéias, se na verdade queres que algo permaneça definitivamente no teu espírito.

Estar em todo o lado é o mesmo que não estar em parte alguma! Ora a quem passa a vida em viagens acontece ter muitos conhecimentos fortuitos, mas nenhum amigo verdadeiro; o mesmo sucede logicamente àqueles que não se aplicam intimamente ao estudo de um pensador, mas sim percorrem todos de passagem a correr.

Um alimento que mal é ingerido imediatamente é “devolvido”, não aproveita nem dá força ao corpo; igualmente nada prejudica tanto a saúde como a freqüente mudança de medicamentos; uma ferida não cicatriza quando se lhe aplicam tentativamente diversos remédios; uma planta nunca se robustece se continuamente a mudamos de lugar; nada enfim, por muito útil, conserva a utilidade em contínua mudança. Demasiada abundância de livros é fonte de dispersão; assim, como não poderás ler tudo quanto possuis, contenta-te em possuir apenas o que possas ler.

Dirás tu:”Mas sinto vontade de folhear ora este livro, ora aquele.” Provar muita coisa é sintoma de estômago embotado; quando são muitos e variados os pratos, só fazem mal em vez de alimentar. Lê, portanto, constantemente autores de confiança e quando sentires vontade de passar a outros, regressa aos primeiros. Reflete todos os dias em qualquer texto que te auxilie a encarar a indigência, a morte, ou qualquer outra calamidade; quando tiveres percorrido diversos textos, escolhe um passo que alimente tua meditação durante o dia.

É isso que eu mesmo faço: de muita coisa que li retenho uma certa máxima. A minha máxima de hoje encontrei-a em Epicuro (é um hábito percorrer os acampamentos alheios, não como desertor, mas sim como batedor!) Diz ele: “É um bem desejável conservar a alegria em plena pobreza".

E com razão, pois se há alegria não pode haver pobreza: não é pobre quem tem pouco, mas sim quem deseja mais. Que importa o que temos no cofre, ou nos celeiros, quantas cabeças de gado ou quanto capital a juros, se fizermos as contas não ao que possuímos, mas ao que queremos possuir? Queres saber qual a justa medida das riquezas? Primeiro: aquilo que é necessário; Segundo: Aquilo que é suficiente!

[Tradução: J.A.Segurado Campos]

sábado, outubro 06, 2007

De Atridas os feitos, de Cadmo os louvores
tentei celebrar;
e a lira rebelde só cantos de amores
me quis entoar.
Impus-lhe outras cordas...trabalho perdido!
A lira troquei;
aos feitos de Alcides a nova convido...
e Amor, lhe escutei!

Adeus, grandes homens! Buscai noutra lira
o vosso louvor!
A minha não sabe; não pode; suspira
só cantos de amor.

[Tradução:Antônio F. de Castilho]

Marcial # 3

34

Sempre pecas, Lésbia, com portas sem guardas e abertas,
e teus furtivos amores não escondes
e, mais que teu amante, deleita-te o espectador,
e os prazeres não te são jucundos, se ocultados.
Porém, uma meretriz com véu e tranca a testemunha expulsa e
raras vezes uma fenda se revela no lupanar de Sumêmio.
Aprende com o pudor de Quione ou de Íade ao menos,
pois os sepulcros ocultam estas torpes lobas.
Acaso, demasiado dura te parece minha censura?
Proíbo-te de seres surpreendida, Lésbia, não fodida.

[Tradução: Alexandre Agnolon] in: Mnemozyne, 2.

Rilke - Torso arcaico de Apolo

Wir kannten nicht sein unerhötes Haupt,
darin die Augenäupgel reiften. Aber
sein Torso glüht noch wie ein Kandelaber,
in dem sein Schauen nur zurückgeschraubt

sich hält und glänzt. Sonst könte nicht der Bug
der Brust dich blenden, und im leisen Drehen
der Lenden Könnte nicht ein Lächeln gehen
zu jener Mitte, die die Zeugung trug.

Sonst stünde dieser Stein entstellt und kurz
unter der Schultern durchsichtigem Sturz
und flimmert nicht so wie Raubtierfelle

und bräche nicht aus allen seinen Rändern
aus wie ein Stern: denn da ist keine Stelle,
die dich nicht sieht. Du musst dein Leben ändern.


Não conhecemos sua cabeça inaudita
Onde as pupilas amadureciam. Mas
Seu torso brilha ainda como um candelabro
No qual o seu olhar, sobre si mesmo voltado

Detém-se e brilha. Do contrário não poderia
Seu mamilo cegar-te e nem à leve curva
Dos rins poderia chegar um sorriso
Até aquele centro, donde o sexo pendia.

De outro modo erguer-se-ia esta pedra breve e mutilada
Sob a queda translúcida dos ombros
E não tremeria assim, como pele selvagem.

E nem explodiria para além de todas as suas fronteiras
Tal como uma estrela. Pois nela não há lugar
Que não te mire: Precisas mudar de vida.

[Tradução de Mário Faustino]

Não sabemos como era a cabeça, que falta,
De pupilas amadurecidas. Porém
O torso arde ainda como um candelabro e tem,
Só que meio apagada, a luz do olhar, que salta

E brilha. Se não fosse assim, a curva rara
Do peito não deslumbraria, nem achar
Caminho poderia um sorriso e baixar
Da anca suave ao centro onde o sexo se alteara.

Não fosse assim, seria essa estátua uma mera
Pedra, um desfigurado mármore, e nem já
Resplandecera mais como pele de fera.

Seus limites não transporia desmedida,
Como uma estrela; pois ali ponto não há
Que não te mire. Força é mudares de vida.

[Tradução de Manuel Bandeira]

Shakespeare - Soneto XVIII

Shall i compare thee to a summer's day?
Thou art more lovely and more temperate:
Rough winds do shake the darling buds of May,
And summer's lease hath all to short a date:
Sometime too hot the eye of heaven shines,
And often is his gold complexion dimmed;
And every fair from fair sometime declines,
By chance or nature's changing course untrimmed.
But thy eternal summer shall not fade,
Nor lose possession of that fair thou ow'st;
Nor shall death brag thou wander'st in his shade,
When in eternal lines to time thou grow'st:
So long as men can breathe, or eyes can see,
So long lives this, and this gives life to thee.



Comparar-te com um dia de verão?
Tens mais doçura e mais amenidade:
Flores de maio, ao vento rude vão
Como o estio se vai, com brevidade:
O sol às vezes em calor se exalta
Ou tem a essência de ouro sem firmeza
E o que é formoso, à formosura falta,
Por sorte ou por mudar-se a natureza.
Mas teu verão eterno brilha a ver-te
Guardando o belo que em ti permanece.
Nem a morte rirá de ensombrecer-te,
Quando em verso imortal, no tempo cresces.
Enquanto o homem respire, o olhar aqueça,
Viva o meu verso e a vida te ofereça.

[Tradução de Jorge Wanderley]

Anacreonte fr.395

Grisalhas já minhas têmporas,
alva minha cabeça e
a graça da juventude
é ida; velhos os dentes,
e não resta muito tempo
para mim na doce vida.

É por isso que eu lamento,
e amiúde temo o Tártaro,
pois tenebroso é o retiro
do Hades, como é terrível
a descida: é certo, sabe-se
que quem desce não mais sobe.

[Tradução: Marcelo Tápia]

Semônides de Amorgos fr.7

Sem elas desde o início um deus criou
o pensamento. Esta, porca cerdosa,
tudo na casa chafurdando em lama,
o caos mantém, se esbalda em seu chiqueiro.
Fedorenta e com vestes mal lavadas
engorda defecando escarranchada.

Outra o deus fez da raposa matreira,
mulher vê-tudo: nada ruim lhe escapa
nem tampouco o que houver de muito bom.
Das coisas muitas vezes fala mal
e bem: um novo impulso a cada instante.

Outra fez da cadela: má, promíscua,
deseja tudo ouvir, tudo saber,
latindo em toda parte, vagabunda,
enxerida mesmo quando sozinha.
Com ameaça um homem não a acalma
nem se, irritado, os dentes lhe quebrasse
em pedra, nem falando docemente.
Mesmo que entre convivas ela esteja
ainda assim inutilmente grita.

Com terra outra os olímpios modelaram
e, estropiada, aos homens empurraram:
nada sabe de bom, nada de mau;
comer é tão somente o que conhece.
E quando manda o deus frio inverno
tremendo ela se encosta junto ao fogo.

Outra do mar, que pensa duas coisas:
num dia dá risada e se diverte;
se a vir em casa um hóspede a elogia:
"mulher mais desejável do que esta
não há entre os humanos, nem mais bela".
Noutro dia, porém, é insuportável
mirá-la ou chegar perto: ela enlouquece
terrível qual cadela em torno às crias,
amarga a todos e de má vontade,
a mesma para amigos e inimigos.
Intrêmula mantém-se, como o mar,
indiferente, muita vez de nautas
alegria suprema no verão;
outras, qual onda violenta enlouquece.
Por seu ímpeto, muito ela parece
com pélago de face variante.

Outra da cinza e teimosa jumenta,
que com coação, repreensão e custo
a tudo se conforma e faz esforço,
mansa; no meio tempo come, em casa,
dia e noite, come até da panela.
Se for também chegada a sacanagem
aceita com prazer qualquer parceiro.

Outra da marta, lamentável raça,
para quem não existe nada belo,
desejável, charmoso ou adorável.
Lascivo e desregrado tem o leito;
nausearia o homem com quem deita.
Roubando, muito mal faz aos vizinhos,
devora às vezes oferenda intacta.

Outra, a caprichosa potranca fez:
tarefas e fadigas vis recusa.
Na mó não quer tocar, nem agitar
peneira, nem jogar dejetos fora,
nem quer ficar ao forno, evitando
breu; se interessar, faz do macho amigo.
Todos os dias lava o seu cascão
duas, três vezes; anda perfumada,
bem penteada, sempre traz a crina
comprida, com flores bem arrumada.
Essa mulher é um belo espetáculo
aos outros: ao marido é uma desgraça,
se não for mão-de-ferro ou sargentão
que disso bem no fundo tenha orgulho.

Outra da macaca: esse excepcional
maior mal Zeus ao homens enviou.
Horríveis carantonhas: tal mulher
andando na cidade é riso certo.
Curto pescoço, andadura dura,
sem nádegas, só pele. Ah! homem triste
aquele que se abraça a um mal assim.
Jeitos, modos de agir ela conhece
como macaca. O riso não lhe importa.
Bem não faz a ninguém, o que percebe,
e para tal medita todo dia:
como fazer podia um mal maior.

Outra da abelha: sorte do que a toma.
A ela só reproche não se aplica,
por ela a vida desabrocha e cresce.
Amiga, envelhece com o amado
após gerar ilustre descendência.
Distinta dentre todas as mulheres
é, circundada de divina graça.
Não se alegra, sentada entre mulheres
quando fazem fofocas femininas.
Com elas Zeus agraciou os homens,
excelentíssimas e muito sábias.

Por invento de Zeus as outras raças
existem habitando entre os homens.
Pois Zeus criou esse supremo mal,
mulheres. Mesmo que ajudar pareçam
ao seu marido, surge um grande mal.
De bom humor não passa um dia inteiro
aquele que o faz com a mulher.
A Fome não se afastará da casa,
conviva odiosa, deusa desalmada.
Quando o homem pensa estar muito feliz
em casa, por favor divino ou humano,
a Crítica ela encontra e arma batalha.
Quando a mulher está ele não pode
com prazer nenhum hóspede acolher.
Aquela que pensar melhor parece,
tanto mais já se encontra corrompida.
Embasbacado o homem, os vizinhos
divertem-se ao ver quanto se engana.
Se cada um pensar em sua mulher
a elogiará, a do outro criticando:
não percebemos ter a mesma sorte...
Pois Zeus criou esse supremo mal,
e aos pés atou inquebrável grilhão.
Quando Hades àqueles acolheu
que lutavam por causa de mulheres
(...)


[Tradução: Breno Sebastiani. in: Mnemozine vol.2]